13 dezembro 2005

MANUEL TRISTE

"Francisco Louçã tem uma pose doutoral, seguro de si, senhor da verdade, carregando algumas sílabas para acentuar o discurso. Não mudou ontem, no debate com Manuel Alegre. Mas, não sendo muitas as coisas que os distinguem, Alegre não aproveitou - a não ser no final do debate - a pose de Louçã para cativar o eleitorado de Esquerda que divide com o candidato do BE. Ao não fazê-lo, somou dissabores. Louçã corrigiu-o pela esquerda algumas vezes, sobretudo no final da primeira parte, quando Alegre chegou a defender que, se um presidente dissolvesse a Assembleia Regional da Madeira, Jardim deveria ser impedido de se candidatar a seguir. Louçã até saltou na cadeira e, depois da lição, Alegre acabou embrulhado sem saber como reparar o disparate em que incorrera.

Aliás, mais do que as ideias expressas - muitas vezes semelhantes -, o que sobressaiu no debate foi alguma incapacidade de Manuel Alegre em aprofundar as questões. Patinou em muitas matérias, deixou dúvidas (por exemplo, sobre a duração do mandato do procurador) onde Louçã tinha certezas (não se deve, disse ele, fazer variações casuísticas ao sabor das circunstâncias).

Ao que parece, crendo nas sondagens, Alegre tem hipóteses de passar à segunda volta e Louçã não. Competia por isso a Alegre cativar o eleitorado de Louçã. Mas ficou longe, muito longe dessa possibilidade, mesmo na parte final em que se defendeu melhor quando Louçã o "encostou às cordas" afirmando que Alegre, aparecendo sem o apoio de um partido, é um homem do PS, tem a sua vida ligada ao partido.

As duas esquerdas ontem em confronto não divergem muito. Separa-as, sobretudo, o facto de pertencerem a gerações diferentes. Louçã, abandonado que foi o PSR e constituído o BE, tem sabido cavalgar o descontentamento de uma certa Esquerda que está cansada das propostas do socialismo democrático do PS. Por isso mesmo, sem pudor, utilizou o minuto final para se dirigir claramente aos socialistas. Alegre, que já não conseguira, no PS, liderar a renovação do partido, deixou claro no debate que não é grande atracção para a renovação do país."

in Jornal de Notícias

Depois desta análise do debate feita pelo director do JN, pouco mais há para dizer, apenas resta a crescente expectativa sobre o debate com Mário Soares e a interrogação se esta postura e este discurso (que se refugia no campo ideológico da Pátria) não se irá se reflectir negativamente em futuras sondagens.